Milagre

"Olhar a orquídea é ter tempo para a vida, e reconhecer nela o milagre que nos permite caminhar todos os dias", Quaresma..

quinta-feira, 14 de novembro de 2013

Alfabetizar para libertar

Outro dia conheci um senhor chamado Chico. Mais de 60 no RG, mais de 80 nos olhos. Trabalhador, desde criança enfrentou a guerra diária por aquilo que era vital, que era necessário, o básico para manter-se nessa luta sua particular. Por suas mãos muitas ferramentas passaram e se acostumaram a elas.

Por vez, num relampejo da mente cansada, dizia para si que lhe falta algo. Mas deixou a vida passar, não correu atrás desse algo a mais que lhe faltava, até porque as cobranças da sua guerra lhe eram maiores. Como Chico, milhões de brasileiros da sua época sofreram com a ausência do “algo a mais” para certa liberdade: um lápis, um papel e algum professor para alfabetizar.

Desde menino (tenho hoje 30 anos) ouço falar dos desafios de fazer com que pessoas comuns, como o nosso personagem da vida real, decifrassem as letras das palavras que elas falavam. A Alfabetização no nosso País sempre foi dos assuntos mais importantes das discussões nacionais. Mas é claro, quase sempre quem as colocou na pauta dos governos foi a sociedade civil, que com esse tempo foi se organizando.

Hoje, poucos de nós sabemos que há uma data no calendário brasileiro para celebrar a alfabetização. E esse dia é hoje, 14 de novembro. Um dia como qualquer outro, pois não é feriado nacional. Contudo, poderia ser um dia como outro qualquer de muitos debates em busca de soluções plausíveis para a Educação dos brasileiros. Porém, a data se mantém como um dia como qualquer outro, sem o devido acirramento do debate que busque quebrar a praxe da política de bolsas assistencialistas.

Num Brasil onde se fala de bilhões para isso e bilhões para aquilo outro, um lugar onde se vende programas e mais programas de reis, o mais incrível é que, enquanto pensávamos que o combate ao analfabetismo vinha avançando por meio de projeto bem vendidos na propaganda governamental, nos deparamos com uma taxa crescente de brasileiros que não sabem ler nem escrever.

Dados de 2012, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) apontam que 8,7%, ou seja, 13,2 milhões de brasileiros são analfabetos. Até 2011 essa taxa era de 8,6. Ganhamos com isso mais de 300 mil novos analfabetos nas estatísticas do nosso ‘brasilzão’.

Desde 1997 vivíamos uma tendência de queda quanto a esses dados negativos. E aqui fica a pergunta: com um orçamento anual cada vez maior, de uma força emergente que, de acordo com a propaganda, passou quase imune à última crise econômica, por que então conseguimos essa proeza de superar economicamente a Inglaterra, ao mesmo tempo em que coroamos milhares pessoas, da nossa força produtiva, como analfabetas?

Um País tão grande quanto as suas desigualdades tem endereço certo quando falamos de problemas sociais. O Nordeste é a região que concentra a maior população de analfabetos do País. Um número assustador de 7,1 milhões de brasileiros. Uma taxa que saiu negativa de 16,9% para 17,4%. O mais curioso é que, o IBGE aponta estagnação dessa taxa no Centro-Oeste, enquanto na região Norte se conseguiu a proeza de manter a redução, muito embora num ritmo decadente.

De setembro de 2008 a abril de 2013, o Programa Brasil Alfabetizado atendeu, em Manaus, o total de 21.679 cidadãos. No Amazonas, o PBA chegou a alfabetizar 84.158 amazonenses no mesmo período. Um trabalho bom, número significativo, mas não poderia parar por ai. Infelizmente estagnou. Hoje a média é de somente mil pessoas por ano, enquanto no começo dos trabalhos do programa foi possível atender mais de 10 mil por ano.


Seu Chico está entre aquelas pessoas que não foram alcançadas pelos projetos dos governos. Talvez nele ainda haja aquela ponta de esperança de conseguir lidar com as letras. Alfabetizar é incluir socialmente pessoas. O discurso tem que deixar de ser somente discurso. Os senhores dos orçamentos precisam dar dignidade àqueles que não tiveram a oportunidade devida lá atrás e garantir o acesso a todas as crianças que estão chegando.

quarta-feira, 30 de outubro de 2013

Meu filho ontem, meu filho hoje

A noite do dia 29 de outubro, de 2007, não foi das mais fáceis para mim, bem como toda conquista valiosa não é. Há de ter sempre muitas pedras no caminho para que o sabor da vida seja aquele do manjar de Deus. Mas essa é outra história que levaria um post único, dado às situações desse dia e as reflexões que aproximaria intimamente um passado remoto ao presente, presente. O mais importante mesmo foi o dia seguinte.

Ao acordar no dia de hoje, 30 de outubro, ainda que com alguma congestão nasal, senti o aroma daquela outra manhã, de seis anos trás. Hoje ele já estava um rapaz do meu lado. Naquele dia, ele ainda se aquecia no ventre da sua protetora. Embora com muito sono, hoje ele abriu os olhos e sorriu pra mim. Naquele passado ele chutava a barriga da sua mãe. Já acordado, ele respondia que dia que era hoje, e insinuava com o polegar que era o seu dia. Naquela manhã de 2007, ele fazia o dia ser todo nosso. Nessa manhã de 2013, o fiz sentir que realmente o dia seria todo dele.

E ele veio – rebento anjo –, às 11h45, com seus 3 quilos e 305 gramas, distribuídos naqueles 49 centímetros. Trazia consigo todo o segredo da felicidade a ser distribuída por ele a conta gotas, como somente as crianças sabem dosar aos pais, tias, tio (um apenas no caso dele) e avós. E foi como eu disse mais cedo, me tornou um homem melhor.

Graças a Deus e o esforço que fiz no dia 29, no dia 30 eu pude assistir a todo o parto, até mesmo algum nervosismo do obstetra, e a tranquilidade quase fria da pediatra. Vi tudo com um rio de lágrimas nos olhos. Não era pra menos, se tratava do meu filho, o mais belo dos milagres que podemos assistir a olho nu.

Depois do primeiro choro paterno eu me tornei um vigilante. Por de trás de uma parede de vidro o acompanhei com o olhar atento para que outras mãos não o tomassem de mim e da mãe dele. Por horas fiz vigília, enquanto aquele corpo gelado como o ártico era aquecido, até que, enfim, fora levado aos braços daquela que o carregou por nove meses.

Seis anos depois me pego reescrevendo mais uma vez sobre ele, sobre esse momento, tentando achar algo de novo para contar. E por incrível que pareça percebo que isso é possível, afinal de contas, a vida tem disso, de ser sempre renovada.

E aqui, compartilho um poema que escrevi na tarde daquele dia abençoado..

Rebento anjo
(ao meu filho Igor Vinícius)
Manaus, 30 de outubro de 2007


Suas asas de anjo saíam lentamente
Do ventre forte da tua protetora.
Aprumavam firmes e celestiais
Rumo à vida nova, sob o meu pranto,
E o sorriso já tranquilo do obstetra.

E doce era o gosto paterno de vê-lo
Alçando o seu primeiro vôo, alvo,
Sobre os braços da pediatra.
Gelado como a neve do ártico,
Anjo, singelamente purificado.

Minhas lágrimas de menino pai
Jorravam frente a sua presença
Que me fazia tremer o corpo
E reascendia a nova esperança
Que em leve aroma doce vai.

Teu forte choro, subitamente,
Me enfeitava a alma de vida, atento
Pela tua vida jovem toda garantida
Aos olhos e ouvidos veementes.
Sim, és Igor Vinícius, o meu rebento.

Filho, tão esperado quanto o vento
Desde a tua primeira morada,
(O ventre forte da tua linda mãe).
E assim tocava a bela canção, de alento,
No início de uma tarde renovada.




quinta-feira, 24 de outubro de 2013

"Tá vendo aquele 'Mercado' moço, eu ajudei a restaurar"

Foto: Paulo André. A dos banners: Ney Mendes. Arte: Glauco Francesco

Foi muito especial o dia em que eu, Ney Mendes e André Tobias produzimos as imagens dessa gente especial - os permissionários mais antigos do Mercadão (que apareceu na foto dessa postagem). O contato com esse pedaço incrível da história da nossa Cidade de Manaus foi muito bom para todos nós. Lições de vida a cada sorriso, a cada gesto, a cada palavra.
Aquela manhã do dia 18 de outubro foi marcante para mim e meus amigos. Com certeza é o tipo de coisa que o trabalho da gente nos proporciona. Emoção por participar de um momento histórico do nosso chão. Trecho esse que poderemos contar para filhos, netos e bisnetos se ainda nos sobre lucidez até lá, como sobrou para minha bisavó Maria, quando me conheceu, eu com meus dezoito anos. Contou das lendas reais de sua vida na sua terra. Da mesma forma gostaria de contar esse trecho da minha vida para próximas gerações, a começar do Igor Vinícius Maquiné Quaresma, meu filho.
Em resumo, o restauro do Mercadão é com toda a certeza, para os nossos tempos, o maior dos marcos da cidade. Quem do processo participou, direta ou indiretamente, só resta a satisfação e a glória de poder dizer como na canção "Cidadão", de Zé Geraldo, interpretada por outro Zé, o Ramalho: "Tá vendo aquele 'Mercado' moço, eu ajudei a restaurar".
Na verdade, creio que isso todo o manauara tem o direito de dizer, até mesmo os mais pessimistas, os mais cretinos, os meninos do rato também. Cada um do seu jeito, cada um no seu posto. Cada um do seu lado. E é claro, do lado de cá, dos que puseram a mão na massa o orgulho é bem maior.
Deixo aqui registrado os parabéns ao amigo Glauco Francesco por conduzir a arte final desses banners e a Priscilla Martiniano que nos ajudou a reunir os doze homenageados que aparecem na foto acima.

sábado, 19 de outubro de 2013

"O Mercadão não é o prédio, são as pessoas"


Recebemos a grata oportunidade de colaborar em parte da produção de inauguração do Mercado Municipal Adolpho Lisboa. Especial mesmo pelo fato de ter que lidar com as pessoas que ajudaram a construir, não o prédio, mas a história desse lugar.
Pessoas como o seu Antônio de Matos, o seu Metal e a dona Eunice... Gente cujo tempo não pesa na hora de abrir aquele sorriso contagiante para a fotografia que ficará para a eternidade. Homens e mulheres que viveram muitos dias de espera, horas demais até mesmo sem esperança de voltar a pisar no chão de onde suas vidas criaram raízes.
Mas hoje a canção não é de lamento. Ela soa como canto de esperança renovada, há algumas horas deles voltarem a entrar no Mercadão para dar a esse lugar uma vida renovada, e desta forma presentear a nossa cidade com a continuação da história viva desse belo legado que é único, que é nosso, que é de Manaus.
Parabéns ao secretário do Centro, Rafael Assayag, por entender que o Mercadão não é só o prédio, ele são as pessoas. Obrigado Rafa pela oportunidade e parabéns a você e à equipe da SEMC Manaus. Como acompanhei mais de perto no início, posso afirmar aqui que vocês fizeram uma agenda diária na obra de restauro para que a construtora não pecasse com o cronograma. Marcaram de perto também os parceiros para que eles não se esquecessem de que esse monumento era prioridade para o nosso povo, para a preservação da nossa identidade.
Parabéns ao prefeito Artur Neto por cumprir com sua promessa de campanha. Sei que ele não fez mais que sua obrigação. Mas não serei eu que negarei aqui os seus méritos. Agora, como está virando moda digo: é esperar que as portas se abram para o povo entrar e ir curtir o mingau de banana, o tacacá e tudo de bom que um digno Mercado Municipal tem a oferecer a sua cidade.



quarta-feira, 28 de agosto de 2013

UMA BREVE REANALISE ANTES DOS 30

        Quando cheguei aos 27, lembro que dentro de mim perturbava uma necessidade de me repensar, rever o que da vida já tinha feito, o que havia construído até aquele instante. Tudo era questão de segundos, milésimos. A vida era curta e não havia mais tempo a perder. No auge da crise existencial, o resumo do filme que passou pela vista mostrava com a síndrome da afobação que muitas coisas eu tinha deixado por fazer. “Porra, mas que merda eu fiz até aqui?”. Aos 28, uma breve reanalise sobre tudo com menor intensidade me deixou mais tranquilo. Aos 29, no meu retorno de saturno, o sentimento já era outro: mais maduro, coerente, sem a afobação típica de três anos trás; fruto de toda vivência brevemente enumerada e das reflexões particulares que me fizeram crer que tudo são matérias e horas complementares dessa formação do dia-a-dia que é a vida de cada um. Perto dos 30, ainda me sinto disponível para caminhar com ousadia, mas é claro, com mais prudência dado as responsabilidades que cercam hoje um pai, um marido, um filho, um profissional. O que me resta agora? Penso que não resta, acredito tudo não são reticências. Continuar a caminhada, mantendo o ritmo da juventude – correndo às vezes – é necessário.

sexta-feira, 21 de junho de 2013

A verdadeira revolução está nas nossas atitudes

       
Algumas verdades só mudam com o tempo e com a persistência daqueles poucos que acreditam na revolução. É uma observação que não custa ser dita nesse momento em que assistimos milhares de pessoas da classe média ir às ruas para levantar cartazes com uma diversidade numerosa de protestos, em muitos casos com aquele humor típico do brasileiro sem causa.

    Fora o vandalismo que tem partido das mãos de poucos – quase sempre com interesses políticos/partidários –, tudo é legítimo nas manifestações que tomam conta do nosso País. Mas, faz-se imprescindível que cada um dos novos revolucionários desse Brasil se mantenha alerta para que, o exercício de cidadania que praticamos nas ruas não caia na mediocridade do aluno que finge que aprende.

       Ao baixar os cartazes e embrulhar as bandeiras é necessário perceber que a maior vitória de uma revolução como essa é a individual, de efeito coletivo. Aquela que, ao entrar no carro passamos a olhar o mundo com outros olhos, respeitando o pedestre sobre a faixa, o vermelho do semáforo, a vaga do idoso; mas se voltar para casa a pé, não jogar cartazes no chão porque faltam lixeiras públicas, nem negar a mão a quem precisa.

       Se faltar essa essência no pós-manifestação de nada valerá ter acordado o gigante, se não apenas ter causado mudanças no quadro político/partidário do País, cujos quadros serão os mesmo por mais algumas décadas, em algum nível de alternância.

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